por
Maria José Nogueira Pinto
Jurista<input ... >, 24 Março de 2006
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Madrid, sem novidade, nestes primeiros dias de Março: nas livrarias mais uns títulos sobre a Guerra Civil (que este ano faz 70 anos...) geralmente também sem grande novidade ou originalidade, talvez com excepção dos que tratam dos aspectos económicos do conflito, como a obra de Sanchez-Asiain.
Mas a temporada política está viva, agitada, conflituosa, sobretudo de há dois anos para cá, quando um golpe estratégico do terrorismo internacional da Al-Qaeda, um gesto de vingança e de dissuasão, se abateu sobre Madrid, nas vésperas de umas eleições gerais que as sondagens davam ganhas pelo PP, e em 48 horas, mudou o resultado!
A Espanha no período do Governo de Aznar e do PP aproveitou bem, sobretudo na economia, o fôlego de crescimento que vinha do desenvolvimentismo dos anos 60 e 70, e consolidou-se como grande potência económica; este período foi também marcado por uma fortíssima criatividade nas artes, nas letras, na moda, no cinema; mas esta pujança espanhola parece agora empalidecer, desde que os atentados terroristas de há dois anos, levaram ao poder o sr. Zapatero.
Na verdade, dois anos depois do início do Governo socialista, a Espanha está a braços com seriíssimos e gravíssimos problemas: a radicalização dos separatismos basco e sobretudo catalão, que põem em sério e próximo risco a unidade do Estado, as erráticas "negociações" com a ETA, que dividem fortemente os espanhóis, com uma parte do país indignada com as cedências do Governo ao grupo de guerrilha armada; os aspectos de clara hostilidade à Igreja Católica e aos católicos, como a controversa aprovação dos matrimónios entre pessoas do mesmo sexo, que trouxeram para a rua centenas de milhares de cidadãos em protesto; a radicalização das questões da emigração, que fazem primeiras páginas de violência e tragédia humana.
É certo que o problema dos nacionalismos basco e catalão não foi inventado pelo PSOE e por Zapatero, é um problema estrutural de qualquer Estado plurinacional democrático, como a monarquia parlamentar espanhola.
No País Basco, a ETA levou a cabo, durante anos, uma campanha de "limpeza ideológica" que acabou por forçar a sair da região, por intimidação, a maior parte dos quadros locais pró-espanhóis, e foi silenciando resistências.
E por isso hoje o Partido Nacionalista Basco pode apanhar, democraticamente, as nozes das árvores que a ETA foi abanando com o terror.
Quanto à Catalunha, os nacional-independentistas catalães construíram discretamente - e foi sobretudo o papel de Jordi Pujol e do seu partido CIU (Convergência e Unidade da Catalunha) - as bases jurídicas e económico- -financeiras de um Estado catalão; depois, por uma política de nativismo "cultural", levaram primeiro à priorização e depois à hegemonia da língua e da cultura catalãs, em relação ao castelhano.
Hoje, seguem nessa via paulatinamente, mas têm um partido nacionalista radical, a ERC, republicano e declaradamente independentista, que vai "abanando as árvores" mais à frente...
Assim, nos complicados equilíbrios e contradições, no emaranhado da "linguagem" e das concessões e negações "institucionais", o Estatuto da Catalunha acabará por aceitar que a Catalunha "é uma Nação".
A ponto de o PP catalão votar no Parlamento Regional contra. Mas não satisfez suficientemente o líder nacionalista republicano, Carod Rovira, que, apesar de satisfeito com 85% do texto vai votar contra!
Do mesmo ano nas Cortes nacionais, o Estatuto só conseguiu 56% dos votos, contra a expectativa de 70% de Zapatero.
Oficialmente, o Governo socialista de Madrid procura disfarçar e manter aquele optimismo simpático, de quem acha que se não se falar ou não forem vistas as coisas, os fantasmas, os perigos, as secessões, as revoluções, eles não acontecerão, serão mantidos à distância não vão materializar-se. É uma política, que infelizmente, também conhecemos por aqui, e de sobra...
Só que a "Espanha é diferente", no sentido em que os fantasmas - o separatismo, o terrorismo, a fractura social ideológica - estão lá.
E podem, com a sua ameaça e a sua presença, atingir o "milagre económico espanhol", como as bombas daquela sexta-feira 11 de Março atingiram uma vitória anunciada como certa do PP.
Mesmo quando a ETA anuncia tréguas.